sexta-feira, agosto 26

Borbemolta

  A monarca, meio tímida, veio compondo uma sinfonia muda que só meus olhos podiam ouvir. Indo de uma ponta a outra ela dançava, cheia de vida, sobre uma partitura que ela desenhava no vento. Vento que lhe balançava no balanço impulsivo de um tango apenas de um.  Entre compassos, colcheias e fusas, ela subia e descia nas pautas, dando nome as claves e colorindo um quadro de notas, preso a um cavalete imaginário que o chão não poderia sustentar.
  Tentei me aproximar da exuberante performance da minha artista incipiente que brilhava fingindo não me notar. A observei marcar a respiração enquanto me perdia na renda refinada de suas asas. Ela mergulhava no ar, vislumbrando seu reflexo na poça d'água da chuva passada e sorria para si enquanto a trilha sonora do momento se alegrava e eu me esquecia do tempo. Melodia que saciava a minha sede, ninfa fugidia do espelho da minha alma, não há como nele se perder.
 Eu fechava os olhos e podia sentir a silhueta frágil de suas vidraças alaranjadas quando essa pequena notável roubava a atenção do meu espírito com a leveza surrealista que ela me presenteava. Modificava o espectro com seus tons e meio tons, sua alteza fez uma reverência cordial aos aplausos sorridentes da incandescência solar, suas cores se distanciaram, sua sinfonia subiu entre as nuvens, invejando o rouxinol narcisista que parou de cantar para ver a majestade insecta voar para outro lugar.